Este projeto pretende explorar a importância da música, da radiodifusão e da propaganda política durante a guerra de libertação que opôs a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) ao sistema colonial português entre 1964 e 1974. Durante todo o conflito, a rádio foi escolhida por ambas as fações como principal meio de propaganda, não só por permitir uma comunicação eficaz em todo o território, mas também pelo facto de a taxa de iliteracia ultrapassar os 93%. Apesar de ter sido um recurso central durante esta guerra, as dimensões sonoras da radiodifusão – incluindo a escolha da linguagem, das notícias, das ideologias políticas e da música – estão surpreendentemente ausentes das principais narrativas académicas sobre este conflito. Este projeto pretende preencher essa lacuna ao considerar a relação entre as dimensões sonoras da radiodifusão e os valores que sustentaram diferentes processos de construção da nação através do som.
Recorrendo à ‘etnografia do passado’ como principal estratégia metodológica, com base em pesquisa de arquivo e entrevistas, este projeto explora os processos de produção e receção de duas estações de rádio com posições políticas opostas: ‘A Voz de Moçambique’, fundada em 1962 pela polícia política portuguesa (PIDE) para conter o avanço dos movimentos de libertação; e ‘A Voz da FRELIMO’, que transmitia a partir da Tanzânia e da Zâmbia para promover os ideais da Frente de Libertação. O objetivo é compreender os principais modelos de produção, incluindo a instrumentalização de práticas expressivas locais para servir os valores ideológicos defendidos por ambos os protagonistas. Também se pretende recolher e analisar múltiplas experiências de escuta por parte de diferentes grupos, incluindo produtores de rádio, soldados e a população em geral. Ao considerar diferentes conteúdos musicais, este projeto também procura identificar a importância de ambas as estações de rádio na produção de diferentes noções de ‘pertença’ e ‘alteridade’, contribuindo para a reavaliação das narrativas dominantes – e predominantemente eurocêntricas – sobre este conflito em solo africano.
Palavras-chave: Música e política, Estudos pós-coloniais, Nacionalismo, Radiodifusão, Conflito.
